A harmonia costuma ser supervalorizada no trabalho em equipe, mas é o conflito, se bem administrado, que faz uma empresa crescer.
A harmonia costuma ser supervalorizada no trabalho em equipe, mas é o conflito, se bem administrado, que faz uma empresa crescer.
Cinco perfis que causam desavenças no escritório
Segundo os americanos Adrian Gostick e Chester Elton, especialistas em cultura organizacional, grupos em que não há contestação são menos inovadores e produtivos que aqueles que discutem.
“Pode parecer contraintuitivo: a maioria dos líderes acha que as pessoas com ideias radicais atrasam as coisas, pois desafiam os processos. Mas, em muitos casos, o radical leva à melhoria”, diz Gostick, que dedica aos conflitos um capítulo do livro “The Best Team Wins” (o melhor time ganha).
Lançado neste ano nos Estados Unidos, sem tradução no Brasil, o livro traz conselhos sobre liderança baseados em estudo com 850 mil profissionais de empresas de diversos setores.
Segundo Gostick, discordar da equipe faz com que novas ideias apareçam. Sem um pouquinho de discórdia, as empresas tendem a fazer o mesmo de sempre.
O gerente de marketing Gustavo Carvalho, por exemplo, conta que sua ideia de trocar a agência de publicidade que divulgava sua empresa de turismo por outra, sem experiência na área, causou muita discussão com os colegas.
“Agências especializadas ficam viciadas em fazer sempre a mesma coisa. Viram executoras, não inovam”, explica. “Mas ninguém dentro da empresa se sentiu seguro. Eu quis mudar essa filosofia da mesmice.”
Foi um processo longo de convencimento: em várias apresentações, ele mostrou outros projetos da agência, que era especializada em design, apresentou soluções para os problemas colocados e, no fim, conseguiu que os colegas dessem uma chance para a sua ideia.
Resolvido na base da argumentação, o conflito foi benéfico, diz Carvalho. “Quando você entra em acordo, o resultado é muito bom, porque todos participaram da decisão.”
Inicialmente, diz ele, seu funcionário radical gera um desconforto -como quando sugeriu deixar os processos de seleção tradicionais da empresa de lado e recrutar via redes sociais para um projeto.O gerente de gestão de pessoas Rafael Miranda, que leva para toda a empresa em que trabalha o seu funcionário “do contra”, é da mesma opinião.
“No começo, a equipe foi bem resistente. Mas acabei topando porque achei bem inovador, que iria fazer diferença”, diz Miranda.
O novo método foi tão bem-sucedido que foi criado um banco de talentos para a empresa, utilizado em outros processos seletivos.
“Quem pensa diferente causa um ruído”, afirma Miranda. “Mas, quando as pessoas veem o projeto andar, é legal, porque percebem que aprenderam com os contrapontos.”
Harmonia total, aliás, é utopia. “Na sua vida pessoal, é provável que quando você saia num sábado à noite discuta com seus amigos e sua família sobre política, futebol, negócios. Discutimos o tempo todo, não porque somos maus, mas porque gostamos do debate”, diz Gostick.
“Porém, quando se trata do trabalho, muitas empresas querem que você desligue seu cérebro e faça o que o seu chefe mandar.”
Empresas devem, então, aceitar a realidade e promover conflitos saudáveis, evitando brigas —essas, sim, problemáticas. Para isso, é preciso fazer com que todos se sintam confortáveis para apresentar ideias, mesmo que pareçam absurdas, sem medo de julgamentos.
“Todo presidente de empresa quer que as pessoas tragam grandes ideias. Você nunca vai ter isso o profissional tiver medo de levantar a voz e ser escutado”, diz Gostick.
Propiciar esse ambiente é tarefa dos líderes. “Isso tem que ser disseminado na cultura da empresa. É um efeito cascata: parte dos gestores, que devem trazer o conflito de forma positiva”, diz Polyana Macedo, coordenadora da consultoria Randstad.
Um bom chefe, diz Gostick, deve promover fóruns para discussões de temas específicos e dar espaço para que discordem de tudo e de todos —até dele.
“O líder que não gosta de discordância é inseguro”, opina a coach Renata Arrepia, da Sociedade Brasileira de Coaching.
O gestor deve garantir também que ideias, e não pessoas, sejam contestadas, nunca com violência. “Se a pessoa chega de modo agressivo, ríspido, inflexível, vai causar um conflito não construtivo, e sim destrutivo”, afirma Felipe Brunieri, gerente da divisão de finanças e tributária da consultoria Talenses.
Se a discussão descambar para o pessoal, os ânimos devem ser esfriados antes que as relações sejam abaladas. “Cabe ao chefe impedir que chegue ao ponto crítico e retomar o tema mais para a frente”, diz Brunieri.
O líder deve mostrar o que é bom e ruim, e orientar, diz Polyana. “É a melhor forma de lidar com isso na equipe. Porque sempre vai ter conflito.”
Fonte: Folha de S. Paulo